domingo, 6 de dezembro de 2009

O grito que ecoa no papel: fanzines e cartuns narram a realidade social

por Jozieli Wolff



Mãos habilidosas e uma mente criativa talvez sejam as características fundamentes dos fanzineiros e cartunistas, que em pleno século XXI ainda espalham criatividade e opiniões no formato de histórias em quadrinhos, cujas narrativas recebem temáticas e traços que refletem, muitas vezes, um posicionamento social.


“Há um lindo manifesto no site da editora Nona Arte, dizendo que, se você não tem dinheiro para publicar um livro em papel couchet, você pode publicar um panfleto de um quarto de folha A4, pois o importante é se expressar”, o dono da frase é o cartunista Rodrigo Mello, um dos fanzineiros que resistem ao século XXI. O pato-branquense de 19 anos, ao produzir fanzines harmonizou desenho e impressões pessoais perante a realidade social.


As primeiras fanzines surgiram nos Estados Unidos na metade do século XX. No Brasil esses pequenos boletins chegaram na década de 1960. Rodrigo explica que “as fanzines são revistas que seguem o lema do “faça você mesmo”, famoso pelo movimento punk. Elas podem ser uma revista com ótima qualidade de papel e diagramação, ou até uma simples fotocópia”.


Cartunistas: fabricantes de piadas em traços

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Rodrigo desenha desde criança, mas foi com 14 anos que seus traços começaram a ganhar expressão. Foi assistindo aulas de história em quadrinhos que ele começou a aperfeiçoar sua técnica, embora suas estórias passem longe dos contextos heroicos. Hoje ele realiza oficinas de desenho em eventos locais, em colégios e faculdades. E não se surpreenda se um dia ao comprar um livro você, leitor, volte para casa com um desenho bem humorado nas mãos, pois Rodrigo faz caricaturas para os clientes de uma livraria de Pato Branco.


Os autores atrás do papel muitas vezes produzem diversas técnicas de desenho, como o cartum. “A princípio, parece fácil desenhar um cartum, pois os traços geralmente são bem rabiscados e simples. Acontece que o traço simples agiliza a leitura e compreensão, deixando a piada engraçada: o cartunista não é só um desenhista de rabiscos, ele precisa estar informado e aplicar a piada no papel de maneira interessante. Devido a dificuldade de fazer charge, existem poucos cartunistas no mercado brasileiro”, destaca Rodrigo.


O jovem desenhista explica que o cartunista pode ser o desenhista de humor, que faz caricaturas ou desenhos com traços humorísticos, entretanto, também é o termo utilizado para descrever qualquer desenhista de história em quadrinhos. “O termo “cartoon” é amplo, surgiu na Inglaterra, para descrever os desenhos estereotipados e com fortes doses de humor e ironias aos desenhados. No Brasil, o maior nome deste estilo é Angelo Agostini, italiano que firmou carreira satirizando Dom Pedro II, os grandes coronéis e a Escravidão. Além de fazer charges para jornais, publicou a “Revista Ilustrada”, que é uma seqüência de charges, formando a primeira história em quadrinhos do Brasil, e uma das primeiras do mundo”, destaca.



Sindromina


O contato e a identificação de Rodrigo com o formato fanzine aconteceu em meados de 2003.

“Quando entrei em contato com as revistas underground da década de 80 (de autores como Angeli, Lourenço Mutarelli e Laerte) me identifiquei demais, e quando conheci o formato fanzine, conheci a maneira que publicaria meus quadrinhos”, relembra.

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Rodrigo, com o apoio de amigos e desconhecidos, publicou em 2007 a revista até então “sem-pé-nem-cabeça”, com 12 páginas e de nome pitoresco: Sindromina. A revista é independente, e está indo para a terceira edição. “Meu objetivo é mostrar para as pessoas da região que produção cultural não precisa ser milionária nem falar difícil. O importante é botar para fora o que está entalado na garganta, tocar o sentimento e provocar reações. Gosto de ser um fanzineiro em pleno século XXI”, revela.


Na primeira edição a produção gráfica foi realizada toda a mão. A fanzine conta a estória de uma menina que vive triste numa pequena cidade, em um futuro distante. Extremamente pressionada pelos pais para estudar ela acaba se vendo com um futuro planejado por eles. Rodrigo colocou na narrativa algumas críticas ao consumismo, a superproteção e a vigilância dos pais. Também acrescentou algumas referências do cinema e da música, e ainda dois poemas dos amigos João Faccio e Diego da Cruz. “Nesse ano eu era vestibulando e acredito que coloquei os anseios da minha turma nesta revista”, frisa.


A música deu a estética da segunda edição da fanzine, publicada em 2008 e diagramada no computador. Na capa há um parasita, Tênia (solitária), tocando gaita de boca, “um blues para passar a solidão”, frisa Rodrigo. Os personagens que compõem a fanzine são: El Justicero ié, ié, ié (inspirado na música dos mutantes), o Parasita(alguém tentando suícidio) e a Sindromina (que nessa edição está adulta). “O legal foi que mais pessoas participaram, mandando fotos, contos e até xilogravura. Lembro que quando publiquei, tinha largado a faculdade e me sentia como um verme, por isso a capa daquela maneira”.


A terceira Sindromina não terá um tom de “protesto” como as outras edições. A temática será “Mochilão, Caronas e Lugares Inusitados”, inspirada no livro On The Road, de Jack Kerouac. Nessa edição Rodrigo contou com a colaboração de Gabriela Titon que o ajudou a organizar o conteúdo, além de amigos que contribuíram com diversos materiais, pois, além dos quadrinhos, a publicação terá fotografias, contos e poemas ilustrados, uma Hq e arte digital. Mas os destaques serão as entrevistas com o jornalista viajante Leandro Taques e com o músico Renato Ladeira, da lendária banda A Bolha. “Desta vez as pessoas se convidaram pra participar, significa que o projeto Sindromina ganhou alguma notoriedade”. Esta edição será lançada dia 11 de dezembro, no Bar El Pancho (em Pato Branco), ao som do bom e velho rock'n roll da banda Jardim Elétrico.

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